05 agosto 2007

Flor-de-Lotus


Um amor do passado é somente uma lembrança.
Um futuro amor é somente uma fantasia.
O amor verdadeiro vive aqui e agora.

~ Buda ~




~ Flor de Lótus ~

No dia em que a flor de lótus desabrochou
A minha mente vagava, e eu não a percebi.
Minha cesta estava vazia e a flor ficou esquecida.
Somente agora e novamente, uma tristeza caiu sobre mim.
Acordei do meu sonho sentindo o doce rastro
De um perfume no vento sul.
Essa vaga doçura fez o meu coração doer de saudade.
Pareceu-me ser o sopro ardente no verão, procurando completar-se.
Eu não sabia então que a flor estava tão perto de mim
Que ela era minha, e que essa perfeita doçura
Tinha desabrochado no fundo do meu coração.

Rabindranath Tagore

02 agosto 2007

Rapunzel bailarina




"Quando não conseguimos encontrar
serenidade
dentro de nós mesmos,
de nada serve procurá-la
em outro lugar..."







Eu conquistei serenidade, rebel
Saindo do mundo de ilusão e dor,
E na tua longa trança, Rapunzel,
Subi à janela do recíproco Amor.



Ainda mal comecei teu poema, e muito tenho para escrever, por esse teu imenso amor cheio de fé e sem receio das distâncias...
Não sei como não te amar assim tanto pelo que tu és e pela generosidade com que decidiste amar este simples poeta, num mundo que mais valoriza a sabedoria de gerir bens e usar pessoas...

Anche io te voglio molto bene, cara Mabi...

Contigo


Para atravessar contigo o deserto do mundo
Para enfrentarmos juntos o terror da morte
Para ver a verdade para perder o medo
Ao lado dos teus passos caminhei

Por ti meu reino meu segredo
Minha rápida noite meu silêncio
Minha pérola redonda e seu oriente
Meu espelho minha vida minha imagem
E abandonei os jardins do paraíso

Cá fora à luz sem véu do dia duro
Sem os espelhos vi que estava nua
E ao descampado se chamava tempo

Por isso com teus gestos me vestiste
E aprendi a viver em pleno vento

Sophia de Mello Breyner Andressen
(Livro Sexto 1962)

01 agosto 2007

Pelas sombras



Ao Padre Francisco de Paula:

C'est que je suis frappé du doute.
C'est que l'étoile de la foi
N'éclaire plus ma noire route.
Tout est abime autour de moi!
(La Morvonnais)






Senhor! A noite é brava... a praia é toda escolhos.
Ladram na escuridão das Circes as cadelas...
As lívidas marés atiram, a meus olhos,
Cadáveres, que riem à face das estrelas!

Da garça do oceano as ensopadas penas
O mórbido suor enxugam-me da testa.
Na aresta do rochedo o pé se firma apenas...
No entanto ouço do abismo a rugidora festa! ...

Nas orlas de meu manto o vendaval s'enrola. . .
Como invisível destra açoita as faces minhas...
Enquanto que eu tropeço... um grito ao longe rola...
"Quem foi?" perguntam rindo as solidões marinhas.

Senhor! Um facho ao menos empresta ao caminhante.
A treva me assoberba... O' Deus! dá-me um clarão!

____

E uma Voz respondeu nas sombras triunfante:
"Acende, ó Viajor! — o facho da Razão!"

____

Senhor! Ao pé do lar, na quietação, na calma
Pode a flama subir brilhante, loura, eterna;
Mas quando os vendavais, rugindo, passam n'alma,
Quem pode resguardar a trêmula lanterna?

Torcida... desgrenhada aos dedos da lufada
Bateu-me contra o rosto... e se abismou na treva,
Eu vi-a vacilar... e minha mão queimada
A lâmpada sem luz embalde ao raio eleva.

Quem fez a gruta — escura, o pirilampo cria!
Quem fez a noite — azul, inventa a estrela clara!
Na fronte do oceano — acende uma ardentia!
Com o floco do Santelmo — a tempestade aclara!

Mas ai! Que a treva interna — a dúvida constante —
Deixaste assoberbar-me em funda escuridão! ...
E uma Voz respondeu nas sombras triunfante:
"Acende, ó Viajor! a Fé no coração!..."

(António de Castro Alves)